Página inicial.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Só precisava ser leve.

Coligir, ter, colecionar idéias. Criar. Se adaptar. Esse amontoado de ações não estava mais se adequando ao tamanho daquele barco. Do pequeno barco. Aquele que atravessava os rios, navegando lentamente, com medo de afundar. "Mas barco navega em rio?" Depende da profundidade.
 E a moça chorava por dentro e sorria por fora. E ainda diziam que ela era espontânea. Um poço sem profundidade, bem ao contrário do rio que abrigava o barco velejante. E, para a moça que ali estava, toda manhã era tachada de entardecer. Todo sol era alaranjado. Toda natureza era sem brilho. O brilho que sempre buscou e que nunca encontrou desde que habitara este território de ilusões. Ela filmava, se filmava, sonhava, se levantava. Chorava e sorria. Mas não sabia. Não sabia se era ensolarado por fora, ou se o problema do escuro era por dentro e tinha dificuldade para abrir as janelas e portas. Avessa. Completamente avessa. Cheia disso. Vivendo em união com um universo paralelo, bem assim. Não sabendo nem ao menos quando estava perdida, ou quando se encontrava. Sabia sem se perder. Se perdia sem saber. Se prendia aleatoriamente em si. E sobretudo, para disfarçar, sorria bonito.
Outrora, quando estava sozinha, se derretia, cantarolando ao som da sinfonia acústica que de, como sempre, lhe acompanhava. E no outro dia, novo dia, sorriso continuo. Sem intenção de se findar. Como já disse: Era feita de avessos. Digna do adjetivo. Sua felicidade era tão... "Verdadeira"... Para quem dizia se estar bem, mesmo não estando. Atriz de novela, era. Que andava certo nas ruas, mas que tropeçava a cada esquina. Que caia, se reerguia, levantava e tentava ser forte, mesmo tentada pelos devaneios que jogavam com ela a todo instante.
Por falar em jogo, o coração estremecerá fácil, fácil. Se perdia, quando interrogado as pressas por... Por quem era dona dele, a moça. "Se acalma menina, isso é realidade. Não é brincadeira de "O quê é, o quê é?". É seu sentimento, considere-o." Gritava as águas do rio.
 Tinha muito, muito sentimento misturado. Tinha amor correspondido, meios/fins, fins/meios, correspondia amor. Confusão! Confundia. Apertava. Defendia. Desrespeitava. Respeitava. Complicava. E ela se perdia, se encontrava, se perdia... Calmaria. Chovia, registrava, molhava a câmera e o papel em que escrevia, pensava, caia, ventou. Pausava as águas do rio: "Para menina. Mente cheia perturba coração sem ordem. Sossega menina, é dia. Vá abrir as janelas do teu quarto. Tá chuviscando aqui fora, deixa lavar o interior. É tempestade em copo d'água, não tem nada de errado acontecendo, tem? É cabeça cheia atoa. Não ligue tanto para os padrões, eles não contam mais. Se jogue, pule, pegue seu guarda-chuva. Venha ver o quanto está bonito o rio. Respire. Enquanto você se preocupa com o que se passa, uns trabalham, outros dormem, os intelectuais jogam xadrez, os meninos brincam de bola na chuva e ninguém observa o rio. Meu bem, a vida segue e você aí, abdicando dela. A tarde toda refletindo sobre coisas que nem fazem mais sentido, ou que só pra você fizeram algum. Levanta menina. Tá calor aí. Aproveita e pega seu guarda-chuva. Compra chocolate e café, sua mãe deixou um bilhete de manhã."
 Já noite, a menina que saiu do barco do seu quarto, ouvia uma voz, que vinha do rio, dizendo as seguintes: "Menina, nem todo encanto é desmedido. O encanto é como a chuva. Da primeira vez que caí, você admira a beleza e elegância das coisas. Acha lindo o cinza da neblina que caí sobre as cidades. Se envolve no edredom de retalhos da vovó, se prende na cama e não quer mais sair. Você olha e tem sinal de chuva por todos os cantos. Mas vem o sol, quer queira, quer não queira e seca. Se chove todos os dias, incomoda. Da mesma maneira é o encanto. Deixa rastro, fascina, conquista, encanta...  Mas depois acaba. E também, encantar-se todos os dias, cansa. Não são todas as pessoas que tem o prazer de faze-lo, sem aperceber, num fixo olhar... Numa mecha de fios no cabelo..."
Aquietou-se a voz, vindo disso, a moça tomou: "Sabe, nunca me disseram isso antes, por talvez medo da minha reação... Mas, a gente sonha de um jeito uma vida e segundos depois se vê interrogando sobre o que e como vai ser se seus planos não derem certo. Como pode, como se explica? De repente eu só queria que os meus sonhos não precisassem de um plano B. E eu, que desde o começo pensei que para se sonhar, não era necessário regras..." ...Face murcha, olhos baixos...
Era de imaginar o turbilhão que se passou por ela naquele momento. Coisas das quais sua expressão resumiu-se em: "Só precisava ser delicado como o velejar do verdadeiro barco, só precisava ser leve como as águas que desaguam aqui. O resto a gente esquenta com café. Só precisava ser leve, só... Pois todo o resto é consequência." E, levando na mão seu guarda-chuva. Retornando, na esperança de lhe aquecer o que restara... Uma lágrima morria nas mãos.
E depois, lá no final da rua...
A moça sorria bonito, mas não sabia.


As noites sombrias, as dúvidas.
 Aos dias amarelados, as inseguranças.
As águas e vozes.
 E, aos rios que embalam os barcos que velejam sem rumo.


Tatiane Salles.

19 comentários:

  1. Certas coisas são tão belas que diante delas nem há o que dizer... Tomara vc pudesse ver meus olhos agora... Só assim vc teria idéia do quanto me tocou essa tua obra-prima... Simplesmente maravilhoso, Tatiane!
    GK

    ResponderExcluir
  2. Nooooooooooossa,Tatiane!!

    Simplesmente encantador teu texto!

    Emocionante!!Adorei! beijos,tudo de bom,chica

    ResponderExcluir
  3. Eu estou boquiaberta e sem palavras................ Que texto é esse??? Você desperta os sentimentos mais ocultos e misteriosos dentro da gente...
    Você é uma artista! (Eu não me canso de dizer)
    Esse texto percorreu minhas lembranças, entrou por dentro de mim... E essas frases finais marcaram minha'alma.
    Você é demais.

    http://senhoritamoca.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  4. Vá treinando. Tu levas jeito. Quem sabe se não viras escritora?
    Um abração. Tenhas um lindo dia.

    ResponderExcluir
  5. Diz à tua amiga, Tati, essa aí
    do sorriso alegre e dos olhos tristonhos,
    que o barco fica tão mais leve
    quanto mais carregado de sonhos...


    Belíssimo texto, Tati... parabéns!

    ResponderExcluir
  6. Um texto pleno de arte na criação e desenvolvimento de uma personagem com seus sonhos e desencantos.Parabens Tati com meus aplausos.
    Carinhoso abraço.

    ResponderExcluir
  7. Un relato que llega al corazón, maravillosas palabras!
    te dejo un fuerte abrazo, bonito miércoles.

    ResponderExcluir
  8. Tati, que post maravilhoso... Bom mesmo é velejar contigo, minha amiga...

    ResponderExcluir
  9. Olá!Boa noite!
    ...estou te falando, tu está escrevendo mais e mais...
    ...a trajetória de uma vida é assim mesmo...encantos, desencantos... para tornar a vida mais leve...temos que ser flexível...saber que os ventos mudam de direção, que a escolha da direção do leme...é você quem decide...
    Obrigado pelo carinho da visita!
    Boa quinta feira!
    Beijos

    ResponderExcluir
  10. Oi Tati
    Você escreve com alma e coração. Um belíssimo conto poético.
    Agradeço o belo poema deixado no meu blog. Você é uma amiga sensacional. Todo o meu carinho pra ti.
    Amiga
    Passei para te deixar
    Um abraço apertadinho
    Um cheirinho bem docinho
    Uma carícia de mansinho
    E para dizer que...
    Eu adoro você!
    Beijinhos encantados
    Gracita

    ResponderExcluir
  11. Meus parabéns Tati, seu texto é de uma imaginação ilustrada; conseguimos nos ver dentro dele, é fantástico, engloba todos os sentimentos possíveis!!!
    Voltarei amanhã com mais tempo, quero explorar mais o seu cantinho lindo, só para dizer...e poetizar com você!
    Beijossss
    Clarice

    ResponderExcluir
  12. Que essa leveza logo chegue e a esperança esteja sempre viva...beijos de bom dia pra ti amiga.

    ResponderExcluir
  13. Poxaa me esqueceu mesmo. Vou chorar...buaaaaaa :(
    Talvez eu seja essa moça com guarda- chuva, nos últimos tempos.
    Que ela encontre o sol, que se permita sonhar sem regras!
    Beijos, até.
    Te espero :(

    ResponderExcluir
  14. Tati!!querida!!
    Sua amizade,faz um bem enorme!!!
    Hoje vim agradecer seu carinho!!!
    Estou retornando aos poucos,ainda estou bem debilitada.
    Bjs no core.Soninha.

    ResponderExcluir
  15. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  16. Minha nossa menina! Você tem o dom nas pontas dos dedos, parece que vejo letra por letra a pingar e pingar. Sem nunca se cansar. “Não ligue tanto para os padrões, eles não contam mais. Se jogue, pule, pegue seu guarda-chuva. Venha ver o quanto está bonito o rio." Amei esses versos e pensei porque não? Hoje quero pegar meu guarda-chuva e sair por ai...
    Um beijo para ti!

    ResponderExcluir
  17. Muito bom Tati (:
    Texto denso de conteúdo, adorei o/
    valeu pela visita de sempre!
    abraço

    ResponderExcluir
  18. Nosssssssa qui orgulho de ter uma amiga assim.
    Lindo texto.

    http://cristinn-aburnyer.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  19. Só passei para dizer...
    Sua amizade é primorosa para mim.
    Beijos de lavanda em seu coração.
    Lua.

    ResponderExcluir

Seu comentário é um combustível pra mim. É o medidor da sua satisfação e me satisfaz também. Comente, esse é o CANTINHO de todos nós. Obrigada!

Seja bem vindo, volte sempre! =)