Cinema. Das estórias que poderiam ter virado histórias... Nada acontece. Nada aconteceu. Talvez fosse o medo de que as cenas principais não fossem bem retratadas. Que as interpretações não ficassem na memória. Que o elenco simples se tornasse parte principal do enredo. Que fossem apenas figurantes, ou qualquer outro papel que chamasse menos atenção. E era o oposto.
Um querendo chamar mais atenção que o outro, e os outros, até esperavam algo a mais disso. Disso que nem teve nome e que se teve, por descuido se perdeu. E eles cansaram de discutir. Discutir o improvável de dar certo... Tempo perdido, mas que de qualquer maneira, fazia bem. Nem sei de qual bem estamos falando agora, creio que seja aquele bem que a gente sente quando gosta mesmo de uma pessoa, mas que ao mesmo tempo se sente mal. Mal em saber que nunca passaria daquilo, de um simples roteiro sem estréia. Sem ter final feliz. E sobretudo, ela ainda se sentava para refletir e escrever sobre suas decepções. Escrevia, apagava, reescrevia, apagava, reescrevia... Como se fosse mudar os planos que não deram certo no passado. Como se fosse escrever seu próprio destino. Como se tudo isso nunca tivesse tido um fim.
E como sempre, ela escultava o que ele tentava explicar, com palavras meio como se falasse outro idioma, mas que ela compreendia, só não demonstrava. Também, ô gênio forte dessa menina, meu DEUS. Era mais que complicado entende-la. Que dizia gostar, mas que não fazia absolutamente nada para que fluísse. Que prometia com atitudes calorosas para com ele, só que não as cumpria da forma desejada. Erro! Que se sentia mal, por não fazer somente a si, mas por fazer mal a ele também... E com isso ela adoecia e não se cuidava. Vivia por procurar alternativas, se perdia, se achava, se perdia; nos cenários da obra. Se perdia mais ainda
nos ponteiros que soavam alto, no atraso do relógio, que vinha de leve, como se não quisesse a felicidade dos dois. As vezes ela se questionava, - Por quê é tão confuso? Se existe sentimento, por quê é tão difícil assim? Ela não era assim, inteiramente desalenta, desatenta... Só se desviava do caminho quando sonhava mais que a caminhada. Ela não era completamente distante. Só não se permitia ficar em meio. Por isso desencaminhou, ele sempre soube. E no meio da reflexão, vinha o diretor, com voz forte, repassar as cenas do dia, para o último teste. E do fundo eles se viam... Era como acorde de violão desafinado, como centenas de barulhos que tocavam intruso dentro da menina. Se perguntando ainda, - Quando foi que permitiu lhe dizer mais de mil vezes coisas que ela nunca teria oportunidade de dizer à ele? Se perguntando, - Por quê foi e voltou tantas vezes, se não tinha intenção de ficar para sempre? Inconsequente! Mas já ele... Ele não gostava, mas ouvia suas canções tediosas, que te faziam bem, só em saber que parte dela estava com ele. Ela era melancólica, mas ele amava o que ela escrevia, escritos que entediavam, mas que ele lia. Lia todos. Lia para adoecer junto, de ver suas tentativas inábeis de permanecer equilibrada no meio fio das palavras. Lia porque os mantinham-vos mais perto, e te-la com ele, mesmo que fosse só com palavras, o deixava melhor. E de longe, ela se sentia melhor também... Numa coisa eles combinavam: Ela sorria por dentro, e ele gostava do sorriso dela. Ele sorria por dentro, e ela gostava do sorriso dele, concomitante. Não! Toda essa unilateralidade não os faziam pequenos sobreviventes, fúteis, ou coisas do gênero. Muito pelo contrário. Se é isso que pensa, é porque nunca viu a forma com que se davam, se tratavam, se gostavam. É porque nunca viu como pediam desculpas, se cometiam erros. É porque nunca se embebedou de tal sensação. Ficava bobo quando ela o chamava pelos apelidos carinhosos. Ria bastante dos seus desenhos prediletos. Ficava bravíssimo quando ela falava de outros garotos, - Era recíproco, né?! Tá, era. rs. Perdiam noites de sono discutindo por ciúmes. Que à "encantava" e ele nem percebia.
Eles eram assim, complicados. Cheios de pontos de vista diferentes, cheios de inventar histórias e pessoas. Sendo que na verdade, esse era pra ser o papel do grande roteirista... Aquele que escreve as cenas, dentro e fora dos filmes. Aquele que tem poder único, mas que por interveniência deles, foi impedido de terminar. Que por serem assim, perderam o papel principal e até a chance de serem figurantes (como temiam a principio). Perderam o poder de serem o que sentiam. Perderam os bastidores, a festa de estréia, o reconhecimento, a presença e o espetáculo cinematográfico. E principalmente perderam a participação mais prazerosa. A possibilidade de viverem a vida real, que dali em diante, sem eles, tornou-se efetivamente,
mera ficção.
Ao que se perde num piscar de olhos.
As histórias e estórias.
Tatiane Salles.